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Fatos Sociais

Os Fatos Sociais e a tentativa de construir uma teoria para entender como os indivíduos agem em sociedade.




É comum que todos nós tentemos dar explicações sobre os fenômenos que nos rodeiam. Essas explicações muitas vezes estão repletas de preconceitos ou até mesmo noções falsas que aprendemos sem nos questionarmos. A sociologia, como disciplina acadêmica, teve então no seu surgimento de se diferenciar deste tipo de explicações que usualmente encontramos no cotidiano e que estão, na maioria das vezes, baseadas em falácias. Com o surgimento e o desenvolvimento da sociologia foi-se criando métodos e teorias para analisar a realidade social a fim de tentarmos encontrar o entendimento correto de como a sociedade se dá e quais os seus mecanismos de funcionamento. É neste contexto que Émile Durkheim cria a teoria dos Fatos Sociais, como uma tentativa ampla de entender como e por que os indivíduos agem em sociedade. Abaixo apresentamos um resumo do que são os Fatos Sociais segundo Durkheim.

 

Fatos Sociais.

Os Fatos Sociais consistem em maneiras de agir, de pensar e de sentir que não dependem do indivíduo. Há algo que está além do indivíduo que, dotado de um poder de coerção, impõe a estes indivíduos tais formas de agir, pensar e de sentir. Deste modo, os Fatos Sociais abrangem muitos fenômenos que nos rodeiam e que praticamos. Mas, devemos separar o que é “Social” do que é “Orgânico, natural”, bem como as ações ou os fenômenos psíquicos que não existem senão na consciência individual, ou seja, só dependem do indivíduo. Vejam então que há uma divisão muito clara entre reconhecer o que está na consciência individual e o que está na esfera social.

Assim, os Fatos Sociais correspondem aos costumes aos quais nos submetemos, às regras éticas e morais que devemos respeitar, à língua que aprendemos para nos comunicar, as leis e normas (escritas e não escritas) que existem no nosso meio, e etc. Ao evocarmos esta característica notamos imediatamente que os fatos sociais existem na sociedade, no todo, e não nos indivíduos, nas partes.

 

Argumentos apresentados por Durkheim para explicitar os Fatos Sociais.

O sociólogo francês chama a atenção para o fato de que nem todo acontecimento humano pode ser caracterizado como um fenômeno social. Aliás, na sociedade contemporânea tem-se muitas vezes “naturalizado” os acontecimentos sociais devido ao grande grau de autonomia do indivíduo, ou mesmo por impulsos egoístas trazidos por nossa forma social baseada no mercado, na produção da distinção, na competição e no consumo. Ou, no extremo têm se argumentado que a sociedade não é uma realidade. A primeira-ministra Britânica, Margaret Thatcher, em 1987 afirmou por exemplo que “a sociedade não existe. Existem homens, existem mulheres e existem famílias”. Esse sentido liberal ignora os mecanismos de funcionamento da sociedade como o organismo coletivo que é.

O que a teoria de Durkheim nos ajuda é perceber que as tentativas de isolar os indivíduos teoricamente não podem chegar ao limite sem desconsiderar grande parte da realidade.  Os indivíduos comem, bebe, dormem, etc., estas são ações corriqueiras que são individuais, logicamente, e é fácil notar isto pois, se fossem sociais – quaisquer uma – não seria necessário diferenciar o que é social e o que é individual. Mas ao imaginar que todas nossas ações não dependem de nada mais além de nós mesmos estamos deixando de perceber todas as implicações de nossas ações e das ações dos outros, como um todo, de como afetamos e somos afetados, de como construímos socialmente a realidade.

Sabemos que Fatos Sociais são maneiras de pensar, de agir e de sentir que existem fora da consciência individual (que são exteriores aos indivíduos). Uma forma de medir isso é notar como a coerção (coibir, reprimir) se exerce sobre nós quando tentamos “burlar” essas formas de agir e pensar, ou seja, normas que estão por aí nos diversos grupos em que participamos. Todas as normas sociais em algum momento são internalizadas pelos indivíduos e com o tempo se torna “natural”, por isso não percebemos o funcionamento da sociedade e suas regras inauditas como algo “artificial”.

Podemos fazer um experimento de imaginação (experimento mental) e tentar pensar o que aconteceria com uma criança que fosse criada com total liberdade de escolha. Como vocês imaginam que ela seria? Quais características desenvolveria?

 

Três características dos Fatos Sociais.

Todo Fato social possui 3 características que o torna um fenômeno que percorre diferentes grupos humanos. Essas características são:

Exterioridade: existem independente da vontade dos indivíduos.

Coercitividade: impõe “penalidades” ou “repressão” àqueles que não cumprem suas normas e regras. No entanto, cabe notar que a repressão social diante de um tal comportamento não é sempre percebida pelos sujeitos e acaba fazendo parte do próprio indivíduo, de sua personalidade ou autoimagem.

Generalidade: estão presentes no conjunto da sociedade, nos seus diferentes grupos ou mesmo como práticas de grupos exclusivos. No entanto, é preciso destacar que os Fatos Sociais não estão contidos nos indivíduos completamente, cada um deles faz um uso particular, mas eles existem enquanto um todo articulado e coeso que se encontra na totalidade destes usos particulares.

 

Aplicando a teoria em uma análise.

Vamos tentar aplicar essa abstração geral chamada Fato Social num fenômeno concreto. Assim, usaremos o Fato Social “Casamento” como um exemplo e tentaremos ver se nele estão presentes essas características citadas acima.

Vejamos: o que quer dizer que Casamento existe independente da vontade de uma pessoa em específico (exterioridade)? Quer dizer que mesmo se alguém nesta cidade ou país considerar o casamento uma bobagem e uma atitude indesejável ele como fenômeno continuará a existir. Não deixará, portanto, de ser uma prática tão logo o indivíduo o desconsidere. Assim, o Casamento é uma prática social que independe de uma decisão individual.

E quanto ao Casamento possuir coercitividade? Como vimos coerção é uma forma de repressão, de punição, que pode ocorrer mesmo se não houver uma lei que diga que alguém deve ser punido ao se descumprir tal recomendação. Com o Fato Social “Casamento” poderia acontecer o mesmo. O Casamento é uma instituição social amplamente desejada e respeitada tanto pelos aspectos religiosos, pelo direito civil, pelas recomendações morais e etc. Casar-se é uma prática humana inclusive compartilhada por praticamente todas as culturas existentes na terra, claro que cada uma a sua maneira. No entanto, pode ser possível que se alguém se recuse a se casar, mesmo em nossa sociedade em que é mais comum vermos pessoas solteiras já em idade ideal de casarem-se. Tais pessoal podem sofrer represálias que vão desde piadas maliciosas, fofocas e provocações humilhantes até o prejuízo de não poderem participar de programas de governo de moradia por não serem prioritários por serem solteiros. Qualquer um que viva em nossa sociedade em determinada idade sentirá algum grau de pressão para casar-se. Essa coerção é tão comum que mesmo as pessoas que não desejam o casamento se sentirão coibidas no convívio social, e por isso mesmo bastante eficiente. Além disso, é comum que os indivíduos nem mesmo percebam que esta forma de pensar e agir é uma regra, pois ele mesmo deseja o casamento como algo valioso. Seu desejo conflui com as normas sociais. Outra coisa curiosa é que neste caso casar-se não é um delito, mas há uma regra tácita[1] de que todos devem fazê-lo. Assim, muitas vezes as regras não escritas ou estabelecidas por um código legal são mais eficientes que a própria lei ou Constituição de um Estado.

Quanto a generalidade é facilmente perceptível que o casamento exerce esse modo de ser em todos os membros sociais como um todo (exceto em casos específicos como celibatários, etc.), fazendo com que cada um deles pratiquem o casamento de acordo com sua pessoalidade, escolhas e convenções. Não é comum ver diferentes tipos de casamento, com diferentes acordos por aí.

 

Conseguem aplicar a teoria em qualquer outro Fato Social percebido por você? Tente, pode ser mais divertido do que imagina.



[1] não formalmente expresso.


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